introdução
Olá, estudante!
Hoje, falaremos sobre alguns aspectos em relação a como profissionais de saúde podem interpretar alguns comportamentos percebidos em seus pacientes.
Mas, talvez, o mais importante a pensar seja bem básico: o que é comportamento? E ainda: o que é considerado comportamento normal e patológico?
Falaremos sobre como esses comportamentos podem interagir com a atenção em saúde mental. Além disso, introduziremos uma classificação mais clássica e muito difundida sobre os comportamentos, no viés da psicanálise, que deve facilitar o entendimento inicial dessas questões.
Vamos lá?
Conhecimento de normal e patológico sobre diferentes perspectivas
Quando tratamos de atenção à saúde mental, o principal elemento que avaliamos é o comportamento do indivíduo. E mesmo quando pensamos em saúde de uma forma geral, o comportamento do paciente pode ser um determinante importante para sua avaliação e seu tratamento. Falar sozinho, rir sem motivos, introversão extrema, ansiedade, roer unhas, tudo isso são comportamentos que podem dar pistas importantes para o profissional em saúde.
Mas, você sabe qual é a definição de comportamento?
Do ponto de vista psicológico, o comportamento pode ser sintetizado como o modo que o ser humano age perante o seu ambiente. É o conjunto de reações, internas e externas, às interações e renovação propiciadas pelo contato com si mesmo e com o meio em que está envolvido (incluindo o meio social), que ocorrem de maneira dinâmica, viva (COMPORTAMENTO, 2022).
A partir deste conceito, uma consequência que remete ao pai da psicanálise, Sigmund Freud, é a estrutura dos nossos funcionamentos. Funcionamentos são padrões de resposta estabelecidos pelos indivíduos. Geralmente, as pessoas respondem de maneira estereotipada, repetindo alguns padrões usuais.
Ele mesmo, Freud, criou três principais eixos de estrutura psíquica que podem determinar funcionamentos e comportamentos: neurótica, psicótica e perversa (FREUD, 2016). O que são eles?
• Neuroses: são funcionamentos em que a pessoa fica com um conflito psíquico mantido em segredo, oculto, inclusive de si mesmo. Por conta disso, o que incomoda fica recalcado (escondido), e o sofrimento e suas causas não podem ser claramente identificados, ou seja, o indivíduo apenas sente. Por falta da identificação da origem, a pessoa pode passar a apresentar sintomas recorrentes (FREUD, 2016).
• Psicoses: na psicose, a pessoa vê fora de si tudo o que tem dificuldade de lidar como sendo seu, o problema está sempre externo a ela. É fundamental diferenciar a visão psicanalítica do que a psiquiatria considera um quadro de psicose, que ocorre quando há uma quebra de contato com a realidade, com alucinações e delírios, por exemplo (FREUD, 2016).
• Perversões: são formas de obtenção de prazer a partir de relações não comuns, por exemplo, os fetiches. Frequentemente, vêm associadas à recusa em reconhecer um problema, uma dor (FREUD, 2016).
Para Freud, uma vez estruturados, esses padrões de funcionamento não podem ser modificados, apenas atenuados a partir da busca de ajuda, por exemplo, na psicoterapia.
E sempre fica uma dúvida: o que é normal ou patológico? O que é um comportamento normal e o que é sintoma? Para isso, temos que olhar o conceito de patologia, que é a forma com que definimos uma ou mais doenças.
Conforme o modelo médico, patologia ou doença é uma estrutura de sofrimento, com características similares, evolução ao longo do tempo, que aumenta riscos para situações específicas e responde a tratamentos de diversas maneiras.
Todavia, aqui, usaremos um conceito mais amplo de patologia, que vem da psicologia, que inclui os adoecimentos psicológicos, os complexos, onde a patologia está associada ao excesso de um padrão de funcionamento. As pessoas passam a responder de forma quase exclusiva, repetida, e a resposta fica enraizada e cristalizada em uma das estruturas que vimos aqui (neurose, psicose e perversão). Esse modelo de patologia pode ou não estar associado a um adoecimento médico (CANGUILHEM, 2009).
E o que são sintomas? “Na psicologia usamos sintoma para descrever uma forma de expressão de um conflito psíquico. Este sintoma não necessariamente aparece no contexto de um adoecimento” (CALAZANS; LUSTOZA, 2012, p. 22).
E o normal?

Epidemiologicamente, baseado na matemática, normal é aquilo que ocorre com maior frequência. Mas a normalidade para a saúde e a psicologia não é apenas isso, envolve tudo que não é considerado patológico seja perante o modelo médico, seja perante o que é considerado patológico para a psicologia.
Comportamento normal e patológico
Já traçamos uma linha para discutirmos o conhecimento de normal e patológico sobre diferentes perspectivas e falamos um pouco sobre funcionamentos e estruturas de comportamento. Mas, você sabe como eles dialogam entre si?
Nós temos como tendência repetir padrões, mesmo que de forma inconsciente. É aparentemente mais fácil. Se funcionou uma vez, seja para nós, seja para alguém que admiramos (como mãe, pai, avô ou tia), a tendência é que aprenderemos a repetir isso. E usamos o mesmo modelo para diversas situações e áreas distintas, isso também é parte de nossa cultura, do nosso aprendizado social.
No entanto, quando estamos repetindo algo que pode não fazer bem para nós ou para os outros, devemos manter o comportamento, simplesmente por fazer parte da nossa cultura ou do modelo aprendido em casa? Nossa resposta imediata e racional é "não"! Mas, e quando é um processo tão precoce, tão enraizado que não conseguimos nem perceber o que fazemos ou pensar em um comportamento diferente? É… Talvez aí fica mais difícil!
Daí surgem as estruturas de funcionamento sugeridas por Freud. Ele, inclusive, fala que elas têm uma origem precoce, na infância. E a questão não é brigar com a pessoa, não é exigir que ela funcione de maneira correta, mas fazê-la entender que aquilo faz mal para ela e pode atrapalhar no desenvolvimento de suas potencialidades. Ela não escolhe funcionar daquela maneira, mas, enquanto profissionais de saúde, será que podemos ajudá-la a entender e repensar esses padrões?
Será que temos que ser todos um pouco psicólogos? Será que essas mudanças são fáceis? Não adianta pensar que qualquer um pode ajudar o outro a resolver seus conflitos em um piscar de olhos, nem que basta falar que um problema existe para que ele se dissolva no ar. Por isso, é importante conhecer estes aspectos e dimensões para pensar em como encaminhar e, principalmente, como não cair na armadilha de funcionar como um modelo complementar.
Complementar? O que significa? Quando falamos de um complementar, falamos de alguém cujo comportamento sustenta os funcionamentos inadequados de outra pessoa. A parceira que oferece mais bebida para o dependente de álcool, por exemplo. É um erro achar que a gente pode corrigir o funcionamento do outro. No entanto, podemos ajudá-lo nesse processo de busca e descobertas.
E aí aparece aquela palavra: normal. A normalidade, entendida como ausência total de sofrimento e de qualquer sentimento negativo, é algo impossível. Algum grau de sofrimento faz parte da existência humana, seja pelas perdas que testemunhamos nos últimos anos, seja pelas coisas que já passaram e deixam saudades. Algum grau de sofrimento faz parte, é considerado normal. Porém, o sofrimento em excesso, que paralisa e bloqueia possibilidades, esse, sim, merece ser entendido e tratado.
Como lidar no dia a dia?
Já aprendemos que comportamentos são as maneiras como as pessoas reagem ao ambiente. A tendência é que as pessoas respondem de maneiras estereotipadas, com padrões de funcionamento. E que estes funcionamentos podem corresponder a estruturas psíquicas que podem ou não ser consideradas normais.
Agora, podemos pensar em como os profissionais de saúde, de posse dessas informações, podem entender melhor o atendimento de seus pacientes, seja no SUS ou em outros contextos.
Ter o domínio destes funcionamentos impacta na prática, não apenas na qualidade do cuidado prestado mas também nas relações humanas dentro dos sistemas de saúde. Se sabemos, por exemplo, que alguém tende a não se responsabilizar pelos seus problemas, por suas eventuais faltas e falhas, sempre se colocando no lugar de vítima, ela não está psicótica no sentido psiquiátrico, mas pode apresentar um funcionamento psicótico do ponto de vista psicanalítico, o que impede que ela desempenhe suas funções ou cuide de sua saúde de forma adequada.
E como isso impacta a nossa vida? Temos que entender que este é um funcionamento daquela pessoa (não nosso) e que a questão é fazer que ela perceba o que está fazendo e que pense em possibilidades de mudar determinados padrões de comportamento que podem ser prejudiciais. Não vai adiantar seguir terceirizando responsabilidades. Ela tem que se apropriar do que é dela.
Outro exemplo é quando um paciente apresenta uma tendência a não falar claramente de seus sintomas, é comum que ele seja rotulado como "chato" ou "poliqueixoso". Mas, temos que considerar que, muitas vezes, são pessoas que têm dificuldades em expressar seus afetos e seus conflitos. A compreensão destas limitações pode fazer com que consigamos ser mais efetivos no acolhimento e no adequado encaminhamento destes casos.
E entre aqueles que apresentam comportamentos dentro da esfera das perversões, temos que ter clareza que, nesses casos, não fazem isso porque são maus, como alguns entendem no significado mais leigo da palavra. Falar em perversão é falar de diversas maneiras de ter prazer, que podem ser prejudiciais ou não à sociedade. Um político corrupto que tem prazer em fraudar, por exemplo, pode impactar negativamente seu grupo.
Um paciente pode apresentar uma perversão que aparece no desrespeito a funcionários na unidade, como recepcionistas, exercendo alguma fantasia rudimentar de poder, enquanto apresenta atitudes submissas frente aos médicos. A identificação destes potenciais é importante, não apenas para apontar a necessidade de correção deste comportamento por parte do usuário, mas para poder orientar e dar o suporte necessário para os funcionários que eventualmente ele fere.
Ao mesmo tempo, é importante reconhecer e informar aqueles que não compreendem o fenômeno, seja por serem vítimas, seja por não perceberem o que pode estar por trás de um padrão de funcionamento. Dessa maneira, podemos ajudar de forma mais efetiva os usuários dos sistemas de saúde, não os rotulando, mas compreendendo que eles podem se comportar de uma maneira pouco usual como reflexo de um sofrimento, de um conflito próprio deles que eles carregam para todas as suas relações.
Vídeo Resumo
No vídeo de hoje, trataremos de conceitos importantes para psicologia como padrões de funcionamento e comportamentos.
Já imaginou como entender melhor alguns tipos de comportamentos, que parecem difíceis de lidar, mas que podem ser reflexo de uma dor ou de um sofrimento, pode melhorar o atendimento e as relações humanas?
Importante aprender a reconhecer essas situações para conduzir melhor as relações com pacientes e colegas. Vamos nessa?
Para visualizar o objeto, acesse seu material digital.
Saiba mais
Hoje, daremos a dica do livro Atualização em avaliação e tratamento das emoções: as emoções e seu processamento normal patológico, que fala sobre o conceito que trabalhamos nessa aula, caso você queira ir mais a fundo nesse tema tão interessante.