introdução
Caro estudante,
A disciplina de Confeitaria tem como objetivo o ensino dos principais conceitos e elementos que compõem a arte da doçaria. É por meio desse conhecimento que o profissional da gastronomia constrói sobremesas e doces com qualidade e técnicas apuradas. Assim, é esperado que, após as aulas ministradas nas quatro unidades da disciplina, você esteja apto a executar massas, cremes e sobremesas básicas da confeitaria.
Nessa primeira aula, você vai aprender um pouco da história da confeitaria no Brasil e no mundo, descobrindo a diferença entre confeitaria clássica e confeitaria artística (cake design) e conhecendo os principais profissionais responsáveis pela elaboração e produção de doces e sobremesas. Indicamos, também, a leitura dos livros indicados nas Referências e no Saiba mais.
Lembre-se: é por meio do estudo e do conhecimento que conquistamos nossa autonomia.
Bons estudos!
Breve histórico da confeitaria
Na Pré-História, o homem alimentava-se, basicamente, de produtos de sua caça e coleta, como cervos, faisões, frutas e sementes. Foi durante o período Neolítico que a natureza nômade dos primeiros hominídeos mudou para a natureza sedentária, dando origem aos primeiros povos agricultores. Além da alteração na alimentação, foi nesse período que o homem começou a dominar o fogo e a criar os utensílios necessários para a cocção de alimentos.
À medida que a civilização se desenvolvia, grandes conglomerados de pessoas foram se juntando e criando as primeiras vilas e cidades, tendo como dieta básica os grãos produzidos em suas próprias plantações. Segundo Suas (2011, p. 6), escavações arqueológicas na região do Rio Nilo, no Egito, apresentaram sinais de que os homens, cerca de 4000 anos a.C., já cultivavam espelta, trigo e cevada para a produção doméstica de produtos alimentícios, como cerveja e pães. É ainda por meio de registros arqueológicos que temos conhecimento dos primeiros bolos produzidos na região do Egito Antigo, usando mel e frutas como elementos adoçantes (REVEL, 1982).
Na Idade Média, as Cruzadas desempenharam um papel essencial para o desenvolvimento da confeitaria, trazendo para o Ocidente o açúcar, então considerado uma especiaria extremamente cara, além de frutas e outros ingredientes que seriam essenciais para a doçaria.
Com as Grandes Navegações, do século XIV ao XVI, a produção do açúcar intensificou-se, especialmente nas Américas e na África, possibilitando o desdobramento e a difusão da produção de doces nas diversas culinárias do mundo, em especial a francesa, a italiana, a alemã e a austríaca. É dessa época o surgimento de grandes clássicos da confeitaria, como o creme frangipane (creme de amêndoas), usado como recheio de tortas clássicas, como a tarte bordaloue, e o macarron.
O século XVIII foi um período de evolução para a confeitaria, com o refinamento dos processos e métodos, e com a incorporação de produtos estrangeiros, como o café, o chá e o chocolate. É possível verificar, também, um grande aumento no consumo de sobremesas geladas, como sorvetes e sorbets (SUAS, 2011).
Também é preciso chamar a atenção para a importância dos mosteiros e conventos no desenvolvimento da confeitaria no Brasil. Os padres e freiras usavam claras de ovos para engomar suas roupas ou clarificar os vinhos produzidos pelas irmandades. Assim, sobravam muitas gemas que, rapidamente, foram incorporadas ao açúcar produzido nos engenhos brasileiros, possibilitando o surgimento da chamada doçaria conventual.
No Brasil, a confeitaria estava intimamente ligada aos processos de conservação de frutas. Devido à alta produtividade das fazendas e pomares, muitos insumos se estragavam. Assim, surgiram os doces de compota, geleias e marmeladas como uma opção para evitar a perda da produção.
Atualmente, a confeitaria se profissionalizou, elevando o chef pâtissier (confeiteiro) a um patamar de importância dentro dos restaurantes e estabelecimentos comerciais de alimentação. Surgiram campeonatos mundiais, como a Copa do Mundo de Confeitaria, e a doçaria ganhou seu espaço na televisão, com programas, séries e reality shows.
Confeitaria clássica x confeitaria artística
Quando falamos em Confeitaria, nos referimos a um vasto campo de conhecimento e produção, que pode ser dividido, basicamente, em duas correntes principais: a confeitaria clássica e a confeitaria artística. Essa divisão não está relacionada somente aos ingredientes utilizados, mas às propostas estéticas e técnicas que compõem a prática do confeiteiro.
A confeitaria clássica está diretamente relacionada à produção de doces considerados clássicos e históricos. Além disso, essa confeitaria tem a característica de estar mais relacionada ao profissional pâtissier, ao desenvolvimento da confeitaria e aos doces e sobremesas empratadas de restaurante. É a confeitaria ensinada nas grandes escolas de culinária do mundo, como a Le Cordon Bleu e o Instituto Americano de Gastronomia (IAG), e a corrente que apresenta as tendências contemporâneas na produção de doces. Assim, podemos encontrar como produtos característicos da confeitaria clássica: as massas básicas, como a folhada; as massas de bolo; a massa choux; cremes, como o creme de confeiteiro; e o chantilly, além de outros produtos.
Reconhecidos profissionais fazem parte dessa corrente, como os franceses Christophe Michalak, Pierre Hermé, Yann Couvreur, Antonio Bachour e Cédric Grolet. No Brasil, podemos citar os chefs confeiteiros Diego Lozano, Flavio Federico, Rhaiza Zanetti, Henrique Rossanelli, Saiko Izawa, Vivianne Wakuda, entre muitos outros.
Por outro lado, a confeitaria artística, também conhecida como cake design ou sugarcraft, desenvolveu-se em maior escala no século XX, mais especificamente a partir dos anos 1990. Esta vertente da confeitaria criou e aperfeiçoou a prática de fazer bolos confeitados, seja com a utilização de pasta americana, glacê real ou outras técnicas e métodos de decoração. Diferentemente da confeitaria clássica, a confeitaria artística tem como foco de atuação as festas particulares, como aniversários e casamentos, e a produção de doces e confeitos para comemorações. Também é possível encontrar como produtos característicos dessa confeitaria os biscoitos decorados e os cupcakes.
Outra característica dessa vertente é a utilização maciça de ingredientes industrializados e/ou com alto teor de açúcar, como leite condensado e pastas de avelã.
Apesar de muitos estudos indicarem a Inglaterra como o berço dessa vertente da confeitaria, vestígios apontam que a Itália, mais precisamente a corte de Catarina de Médicis, foi a precursora na decoração de bolos. Atualmente, os grandes expoentes da confeitaria artística estão nos Estados Unidos – em especial os que trabalham com fondant, pasta americana e glacê real –, e na Coréia do Sul, que desenvolveu técnicas avançadas de buttercream, como o glossy buttercream, o shiny buttercream e a bean paste (pasta de feijão).
Entre os confeiteiros mais conhecidos da confeitaria artística, podemos citar Buddy Valastros, famoso por reality shows e confeitarias internacionais, Peggy Porschen, Mich Turner e Candace Nelson. No Brasil, a confeitaria artística é bastante presente no cenário da gastronomia, tendo reconhecidos profissionais, como Mara Cakes, Tabata Romero, Ana Salinas e Douglas Marchione.
Profissionais de confeitaria
Conforme visto anteriormente, a área da confeitaria é um vasto campo de conhecimento, com diversas possibilidades de atuação para os profissionais da gastronomia. Segundo Costa et al. (2018, p. 15), “com a evolução da confeitaria e a ampla gama de serviços e produtos oferecidos, houve a necessidade de setorizar o ramo”. Assim, diversos profissionais com conhecimentos específicos vão surgindo na área da confeitaria, responsabilizando-se pelo estudo, desenvolvimento e produção dos itens de doçaria. A seguir, identificamos alguns desses profissionais.
O principal profissional é o chef executivo de confeitaria, também conhecido como chef pâtissier. Ele é o responsável por toda a produção de uma confeitaria ou da praça de confeitaria de um restaurante. Sua área de atuação vai desde a criação do cardápio e de testes até a confecção e o resultado final, atuando direta e indiretamente na produção dos doces. Além disso, é o responsável pelo gerenciamento das equipes que vão atuar na área da confeitaria.
O confeiteiro, ou confiseur, é o profissional que compõe as equipes das praças de confeitaria, responsável pela preparação de grande parte dos produtos do estabelecimento, como massas, bolos, cremes, caldas, sobremesas, etc. De acordo com Costa et al. (2018), normalmente é possível verificar esses profissionais sendo auxiliados por pessoal específico para a realização da mise en place. Pode, também, ser responsável por auxiliar o chef executivo de confeitaria na elaboração de novas técnicas e produtos.
O decorador, ou decoratéur, é o responsável pela produção e elaboração de itens decorativos, como esculturas de açúcar, cortes de frutas e elementos estéticos. Não é um cargo muito comum nas brigadas de confeitaria. Existe um profissional, chamado sucrier, que tem como responsabilidade a elaboração de caldas e esculturas em açúcar. Em alguns lugares, é possível verificar as duas funções sendo executadas por um único profissional.
O chef chocolatier prepara todos os produtos que têm o chocolate como base principal. Assim, é o responsável pelos trabalhos de temperagem, elaboração de bombons, trufas, ganaches, namelakas e elementos decorativos em chocolate. Por ter um trabalho extremamente singular, que requer temperatura e umidade específicas, o chef chocolatier, usualmente, possui uma área reservada para seu trabalho.
O sorveteiro, ou chef gelatier, prepara as sobremesas geladas, como sorvetes, sorbets, granitas, semifredos, parfaits, entre outros. Segundo Costa et al. (2018), esse profissional costuma trabalhar sozinho, pois assim como o chef chocolatier, precisa de uma área com climatização específica para a execução de seus produtos com padrões de qualidade.
Além dos profissionais citados anteriormente, as confeitarias ou praças de confeitaria em restaurante também podem contar com padeiros, ou chef boulanger, para a elaboração de algumas massas que possuem como características a utilização de fermentos biológicos, como as massas usadas para sonhos, baba au rhum, ou até mesmo para a produção de massas folhadas e pães doces.
Cabe ressaltar que a presença de profissionais específicos para cada atividade está condicionada ao tamanho do estabelecimento, bem como ao tamanho do cardápio e à especificidade dos produtos a serem elaborados e disponibilizados para os comensais (clientes).
videoaula
Nessa aula, foi apresentado um breve histórico da confeitaria no Brasil e no mundo. Descobrimos a importância das Cruzadas, para difundir o açúcar, e das plantações de cana na América para o desenvolvimento da doçaria mundial. Além disso, vimos que existe diferença entre confeitaria clássica e confeitaria artística, e que, por apresentar características distintas e técnicas específicas, o trabalho na confeitaria é executado por diversos profissionais. Vamos aprender um pouco mais?
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Saiba mais
Um dos profissionais da confeitaria mais importantes da história foi o francês Marie-Antoine Carême.
Carême (1783-1833), conhecido como “chef dos reis e rei dos chefs”, nasceu em Paris e tornou-se célebre na área da confeitaria por ter sido o responsável pela simplificação e codificação de muitas bases da confeitaria clássica. Além disso, é considerado o pai da haute cuisine (alta cozinha), sendo o responsável por difundir esse estilo de gastronomia.
Em seu trabalho, chama-se a atenção para as pièces montées, grandes composições de confeitaria, com técnicas elaboradas, comparáveis a obras arquitetônicas. Carême também escreveu livros clássicos e importantes para o desenvolvimento da gastronomia e da confeitaria, como o livro Le Pâtissier Pittoresque (O confeiteiro pitoresco).
Ficou curioso? Assista ao vídeo indicado a seguir com mais informações sobre Carême, e não deixe de ler o livro de Ian Kelly, indicado nas referências dessa aula.
Link para o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=LJHXdJlwy2M.